Desta
forma, este artigo discorre alguns dos pontos importantes do hábito de
alimentação e da interação dos bovinos com o ambiente pastagem.
Introdução
Nos
últimos anos têm ocorrido mudanças significativas sobre os conceitos da
produção animal em pastagens. Modelos que preconizavam máximas
produtividades, baseados quase em sua totalidade em elevadas doses de
fertilizantes e com uso muitas vezes inconsequente de irrigação,
denominados de “produção intensiva”, vêm sendo questionados e até
substituídos por outras modalidades de exploração baseadas no melhor
entendimento das relações planta-animal na pastagem.
Para
Carvalho (2005), o conceito de “intensificação” é um processo complexo e
dinâmico, altamente dependente da compreensão e entendimento da
interação das respostas de plantas e animais no ecossistema pastagem.
Dessa
forma, uma reformulação dos conceitos relativos à condução de sistemas
de produção animal em pastagens faz-se necessária, de modo que o manejo
da pastagem deve ser encarado como a ação de criar ambientes pastoris
adequados que aperfeiçoem o consumo de nutrientes pelos animais em
pastejo (Carvalho e Moraes, 2005).
Assim,
ao assumir que as pastagens devem ser consideradas como uma população
de perfilhos em processo contínuo de produção que pode ser acelerado
pela desfolhação da planta e conseqüente melhoria do ambiente luminoso
na base do dossel. O conhecimento dos animais, suas necessidades e
preferências na busca e colheita do alimento nas pastagens é ponto-chave
para a perenidade das gramíneas e intensificação dos sistemas de
produção.
Análise
As
plantas forrageiras, em seu processo evolutivo, desenvolveram
mecanismos de resistência e adaptação ao pastejo a fim de assegurar sua
sobrevivência. Briske (1996) os classifica como mecanismos de
tolerância, que englobam adaptações fisiológicas de curto prazo, como a
alocação preferencial de carbono para os meristemas apicais de perfilhos
com o objetivo de maximizar o aparecimento e alongamento de novas
folhas, e os mecanismos de escape, que envolvem adaptações morfológicas
de médio e longo prazo, como por exemplo, o aumento da área foliar
específica, que reduzem a severidade de futuras desfolhações.
As
pastagens tropicais existentes no Brasil têm uma distribuição
heterogênea no que condiz a quantidade e qualidade de forragem
disponível, ocorrendo ainda grande variação de massa ofertada ao longo
da época do ano, o que afeta sensivelmente a qualidade nutricional das
plantas forrageiras devido as variações na relação caule:folha e na sua
composição bromatológica (Figura 1) .
Figura 1: Variação qualitativa de forrageiras ao longo do seu ciclo de crescimento e desenvolvimento.
Laca
e Lemaire (2000) denominam essa oferta desigual da parte aérea da
forragem ao longo do ano de estrutura do dossel, e suas variações são
determinantes para as respostas produtivas de vacas leiteiras em
condições de pastejo.
Em um
ambiente de pastagem, as respostas tanto de plantas forrageiras como dos
animais em pastejo são condicionadas e determinadas por variações em
estrutura e dossel forrageiro (Hodgson e Da Silva, 2002).
Ao
pastar, os bovinos tendem a levar a camada superior das plantas que
contém mais folha, ou seja, ocorre uma preferência por folhas em
detrimento ao caule, essa seletividade ocorre devido ao maior teor de
proteína e teores mais baixos de fibra, o que conseqüentemente,
proporciona digestibilidade maior das folhas em relação aos caules.
Quando o relvado é curto eles compensam com o aumento do tempo de
pastejo (Hall, 2002).
O processo
de utilização e colheita da forragem pelos animais em pastejo
(quantidade e valor nutritivo) é função do entendimento de aspectos
relativos à interface planta:animal, característica determinante e
condicionadora das relações de causa:efeito entre práticas de manejo do
pastejo e desempenho animal. Portanto, o conhecimento da interação entre
estrutura do dossel forrageiro e comportamento ingestivo é um passo
fundamental a fim de que o manejo do pastejo possa ser considerado
dentro de uma realidade de eventos fisiológicos, propiciando que tomadas
de decisão sejam amparadas por critérios científicos baseados na forma e
função das plantas forrageiras e na maneira pela qual estas influenciam
e determinam o consumo de forragem de animais em pastejo (Reis e Da
Silva, 2006).
O processo de
pastejo adquire ainda um caráter bastante complexo se for considerado
que os animais possuem preferências que se manifestam em função das
restrições de acesso e oferta de forragem existentes (Da Silva 2006) e
que também possuem uma capacidade de aprendizado que os confere uma
memória de referência que pode durar cerca de 20 dias (Bailey et al.,
1996), além de poderem delegar sensações boas ou ruins a um determinado
tipo de forragem (Provenza, 1995) podendo assim evitá-las ou
priorizá-las por algum tempo.
Assim,
o animal em pastejo é obrigado a tomar decisões rápidas para colher de
forma eficiente a forragem. Em Da Silva (2006) são abordados diversos
trabalhos (Laca e Demment, 1996; Gibb, 1998, Ruyle e Dwyer, 1985 e
Prache et al., 1998), onde se conclui que essas tomadas de decisões dos
animais envolvem um “julgamento” entre custo/benefício na aquisição de
forragem, de forma que os mesmos, na tentativa de otimizar a forma de
pastejo, elegem uma pequena área (um semicírculo hipotético, ilustrado
na figura 2) denominada de estação alimentar, onde os bocados - menores
escalas de decisão - são realizados. Ao conjunto de estações alimentares
separado de outro conjunto por uma parada na seqüência de pastejo em
que o animal normalmente se reorienta para um novo local corresponde a
um patch, e um agregado de patches, em uma área contínua onde os animais
pastejariam até a interrupção para descanso ou ruminação são
denominados sítios de pastejo (Bailey et al., 1996). Este autor ainda
determina um campo de pastejo como um agregado de sítios de pastejo
delimitados por cercas ou barreiras naturais onde os animais teriam
acesso a sombra e água.
Portanto,
para lidar com o desafio de se alimentar em ambiente tão complexo, os
animais em pastejo se obrigam a tomar inúmeras decisões. Decisões desde
escalas em nível de segundos (bocado e estação alimentar (EA), de
minutos (patch), de horas (sítio de pastejo - refeição), de dias (tempo
diário de pastejo), até escalas em nível de ano, quando já se envolvem
interações sociais, reprodutivas, migratórias, dentre outras (Bailey
& Provenza, 2008).
Figura 2: Representação esquemática de um animal explorando uma estação alimentar.
O
deslocamento de animais em pastejo, em busca de novas estações
alimentares foi muito bem apresentado por Carvalho e Moraes (2005) em
condições de baixa e alta oferta forrageira (Figura 3).
Figura
3: Representação esquemática da distribuição de estações alimentares
numa pastagem hipotética em situação de elevada (a) e de baixa massa de
forragem (b).
Na
Figura 3 ficam nítidos dois patches área de pastagem, caracterizados
pela interrupção na seqüência de pastejo. Nos patchs observados na
situação de elevada massa de forragem, o número de estações alimentares é
menor, devido ao maior tempo de permanência em cada estação alimentar.
Pela representação, pode-se verificar a possibilidade de sobreposição de
estações alimentares, particularmente em baixas massas de forragem.
A
área das estações alimentares é semelhante em ambas as situações, pois é
definida pelo alcance do pescoço e da língua do animal. As estações na
pastagem de maior massa são mais escuras, ilustrando a maior
concentração de forragem em tais condições, das quais decorre o maior
tempo de permanência na estação.
Os
animais utilizam padrões de deslocamento diferentes em função da oferta
de forragem (Hengeveld 2007 apud. Carvalho et al. 2008)
O
hábito de pastejo dos ruminantes condiz de um movimento para “cercar” a
forragem com a língua e os dentes incisivos inferiores, prendendo o
material no palato superior e em seguida, um movimento de cabeça rompe a
forragem. Quando há pouca folha os bovinos compensam pastando por
longos períodos e com uma taxa de bocado crescente, podendo chegar a até
70 bocados por minuto (Phillips, 1993). Desse modo, a ingestão diária
de forragem é o resultado do produto entre o tempo gasto pelo animal na
atividade de pastejo e a taxa de consumo de forragem durante esse
período que, por sua vez, é o resultado do produto entre o número de
bocados por unidade de tempo (taxa de bocado) e a quantidade de bocado
(massa de bocado) (Erlinger et al., 1990 apud Reis e Da Silva, 2006).
Sendo a massa de bocado a variável mais importante na determinação do
consumo de animais em pastejo e a mais influenciada pela estrutura do
dossel forrageiro (Hodgson, 1985).
A
ingestão de forragem por bocado é muito sensível a variações
estruturais, particularmente em altura de dossel forrageiro (Cosgrove,
1997) e assim, caso ocorra uma redução da massa de bocado, o consumo de
matéria seca também será afetado.
A
seletividade ou processo seletivo é a medida de escolha de alimento e
tem influência sobre o comportamento ingestivo de bovinos em regime de
pastejo. A preferência dos animais por determinado alimento é
conseqüência de fatores conjuntos, inerentes às plantas (composição
químico-bromatológica, morfologia, estágio de maturação e
disponibilidade), ao ambiente (clima e solo) e ao manejo adotado.
Pressões
de pastejo mais leves possibilitam aos animais a oportunidade de
seleção para composição de suas dietas, favorecendo a escolha por partes
mais palatáveis e nutritivas (Oliveira et al., 2007), o que permite aos
animais selecionar as folhas em detrimento aos caules. Enquanto
elevadas pressões de pastejo atuam de forma contrária, resultando em
consumo de partes menos palatáveis (caules) das forrageiras. Assim, o
conhecimento de como a disponibilidade de matéria seca proveniente de
folhas verdes varia com o avanço da idade da planta, em diferentes
condições de manejo e de ambiente, ao longo do ano, é fator fundamental
para obtenção de máxima produção por unidade de área (Barbosa, 1998).
Conclusão
O
manejo de pastagens deve ser visto como a construção de estruturas de
pasto que favoreçam a colheita de forragem pelo animal em pastejo.
Uma
vez que o processo de pastejo se dá em diferentes escalas, cada uma
delas com padrões diferentes de comportamento por parte animal, as ações
de manejo das pastagens afetam o processo de pastejo diferentemente em
cada escala.
Alberto Chambela Neto
Fonte: IEPEC
Nenhum comentário:
Postar um comentário